Lutz Coelho Advogados

Função Social da Propriedade no Direito Agrário



A função social da propriedade é considerada o instrumento de alicerce dentro dos contratos agrários, expresso no inciso XXIII do Art. 5° da Constituição Federal de 1988, como limitador do direito à propriedade. Normalmente esse princípio vem relacionado ao direito ambiental, sendo mencionado pelo professor Lutz Coelho como uma das faces da função social, à medida que “toma conta dos interesses da coletividade”

A função social da propriedade encontra-se acolhida na grande parte dos ordenamentos jurídicos de inspiração romano-canônica, mesmo que não expressa em sede legislativa. No Brasil, não só expresso no artigo supracitado, outros inúmeros fazem referência ao princípio basilar da propriedade, garantindo não só esse direito, mas também o cumprimento da imposição social. A menção também ocorre no título relativo à ordem social e econômica, e em seguida no capítulo destinado a propriedade agrícola e fundiária e também a reforma agrária.

O Art. 186, da Lei Maior, preceitua que “a função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I - aproveitamento racional e adequado;
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.”

A propriedade, passa a ser vista como um elemento de transformação social, que deve ser analisado não só a luz da Constituição Federal de 1988, mas também da complementação por leis infraconstitucionais, como a Lei 8.629 de 1993, a qual define a propriedade produtiva e estabelece critérios para a sua configuração, bem como estabelece requisitos para o cumprimento da função social da propriedade, como se visualiza abaixo.

“Art. 6º Considera-se propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente.

§ 1º O grau de utilização da terra, para efeito do caput deste artigo, deverá ser igual ou superior a 80% (oitenta por cento), calculado pela relação percentual entre a área efetivamente utilizada e a área aproveitável total do imóvel.

§ 2º O grau de eficiência na exploração da terra deverá ser igual ou superior a 100% (cem por cento), e será obtido de acordo com a seguinte sistemática:

I - para os produtos vegetais, divide-se a quantidade colhida de cada produto pelos respectivos índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea;
II - para a exploração pecuária, divide-se o número total de Unidades Animais (UA) do rebanho, pelo índice de lotação estabelecido pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea;
III - a soma dos resultados obtidos na forma dos incisos I e II deste artigo, dividida pela área efetivamente utilizada e multiplicada por 100 (cem), determina o grau de eficiência na exploração.

§ 3º Considera-se efetivamente utilizadas:

I - as áreas plantadas com produtos vegetais;
II - as áreas de pastagens nativas e plantadas, observado o índice de lotação por zona de pecuária, fixado pelo Poder Executivo;
III - as áreas de exploração extrativa vegetal ou florestal, observados os índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea, e a legislação ambiental;
IV - as áreas de exploração de florestas nativas, de acordo com plano de exploração e nas condições estabelecidas pelo órgão federal competente;
V - as áreas sob processos técnicos de formação ou recuperação de pastagens ou de culturas permanentes V - as áreas sob processos técnicos de formação ou recuperação de pastagens ou de culturas permanentes, tecnicamente conduzidas e devidamente comprovadas, mediante documentação e Anotação de Responsabilidade Técnica.

§ 4º No caso de consórcio ou intercalação de culturas, considera-se efetivamente utilizada a área total do consórcio ou intercalação.

§ 5º No caso de mais de um cultivo no ano, com um ou mais produtos, no mesmo espaço, considera-se efetivamente utilizada a maior área usada no ano considerado.

§ 6º Para os produtos que não tenham índices de rendimentos fixados, adotar-se-á a área utilizada com esses produtos, com resultado do cálculo previsto no inciso I do § 2º deste artigo.

§ 7º Não perderá a qualificação de propriedade produtiva o imóvel que, por razões de força maior, caso fortuito ou de renovação de pastagens tecnicamente conduzida, devidamente comprovados pelo órgão competente, deixar de apresentar, no ano respectivo, os graus de eficiência na exploração, exigidos para a espécie.

§ 8º São garantidos os incentivos fiscais referentes ao Imposto Territorial Rural relacionados com os graus de utilização e de eficiência na exploração, conforme o disposto no art. 49 da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964." (Constituição Federal de 1988)

"Art. 9º A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo graus e critérios estabelecidos nesta lei, os seguintes requisitos:

I - aproveitamento racional e adequado;
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

§ 1º Considera-se racional e adequado o aproveitamento que atinja os graus de utilização da terra e de eficiência na exploração especificados nos §§ 1º a 7º do art. 6º desta lei.

§ 2º Considera-se adequada a utilização dos recursos naturais disponíveis quando a exploração se faz respeitando a vocação natural da terra, de modo a manter o potencial produtivo da propriedade.

§ 3º Considera-se preservação do meio ambiente a manutenção das características próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, na medida adequada à manutenção do equilíbrio ecológico da propriedade e da saúde e qualidade de vida das comunidades vizinhas.

§ 4º A observância das disposições que regulam as relações de trabalho implica tanto o respeito às leis trabalhistas e aos contratos coletivos de trabalho, como às disposições que disciplinam os contratos de arrendamento e parceria rurais.

§ 5º A exploração que favorece o bem-estar dos proprietários e trabalhadores rurais é a que objetiva o atendimento das necessidades básicas dos que trabalham a terra, observa as normas de segurança do trabalho e não provoca conflitos e tensões sociais no imóvel." (Constituição Federal de 1988)

Como diz o professor Lutz Coelho, já mencionado, “não se está negando o direito de propriedade, mas apenas se induzindo um interesse preponderante, que corresponde ao interesse da coletividade, em busca de que a propriedade seja um mecanismo de justiça social”. No entanto, a teoria tridimensional da função da terra, ao ser analisada conjuntamente com as lições de Darcy Walmor Zibetti, proclama a esfera econômica, social e ecológica da terra, chegando a uma nova conceituação de propriedade agrária.

Artigo do Professor Lutz Coelho sobre o assunto

Referência
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988
LUTZ, José Fernando Coelho. Contratos agrários: uma visão neoagrarista. 2° Edição. Curitiba: Juruá, 2016.

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